Não são os professores que estão doutrinando jovens. São os gurus de redes sociais.

Queridos pais, os professores não estão transformando os seus filhos em massa de manobra para fins ideológicos. E também não estão instigando milhões de seguidores ao culto de suas personalidades. Não são eles que induzem os jovens ao vício em Internet para lucrar com o engajamento compulsivo em torno de seus conteúdos. Quem faz isso são os gurus e charlatões de redes sociais.
Professores mal são ouvidos. É uma luta para manter a disciplina! Pesquisas demonstram que cerca de 20% do tempo de aula é desperdiçado apenas para pedir silêncio. Com turmas lotadas, sempre além da capacidade adequada para a aprendizagem; e frequentemente lidando com problemas básicos de infraestrutura — como a falta de ventiladores nas salas — educadores enfrentam dificuldades diárias para despertar a atenção dos alunos, até mesmo para os conteúdos cobrados nas avaliações.
Nos últimos anos, em parte devido à histeria de movimentos fundamentalistas que decidiram atribuir aos professores o papel de bodes expiatórios de suas fantasias conspiratórias, o respeito ao trabalho docente vem decaindo entre estudantes e suas famílias: como resultado, o Brasil ficou em último lugar no Índice Global de Status de Professores de 2018. Os trabalhadores da educação, a ponta mais frágil do sistema de ensino, têm sido sistematicamente desmoralizados e desacreditados. Basta ver a hostilidade pela qual são tratados quando se organizam para reivindicar seus direitos.
Por outro lado, dados do relatório 2018 Global Digital demonstram que, no Brasil, jovens passam, em média, mais de nove horas por dia navegando na Internet. Você não leu errado: mais de nove horas navegando, todos os dias. Isso é praticamente o dobro do tempo que passam na escola. E em geral, sozinhos em seus celulares, sem acompanhamento de adultos. Só nas redes sociais, são mais de 3 horas e meia diárias consumindo, produzindo e interagindo em seus universos — ou melhor, guetos de interesse. Consequentemente, sob vista grossa das famílias, que preferem fingir que o problema não é delas, crianças e jovens desperdiçam o dia ouvindo, lendo e reproduzindo barbaridades de ignorantes histéricos no YouTube, no Facebook, no Instagram e no Twitter — empresas que dominam o mercado da economia da atenção.

É um auto-engano perigoso supor que jovens consomem informação de qualidade em seu isolamento na Internet. A lógica das redes sociais já é bem conhecida: quanto mais escandalosa, agressiva ou sensacionalista a mensagem, maior o “engajamento” — um eufemismo publicitário para se referir ao vício. Emoções intensas, para o bem ou para o mal, são altamente viralizáveis. E o problema nem é propriamente a tecnologia em si, mas o modelo de negócio baseado em acesso gratuito, coleta massiva de dados e análises de perfis para fins de direcionamento de conteúdos meticulosamente ajustados à psicologia individual, que faz da plataforma uma experiência viciante por definição.
Deste modo, ao manipular as inseguranças de jovens solitários e ansiosos por símbolos de identidade e aceitação social, charlatões que lucram com a propaganda exibida em seus conteúdos instigam os ânimos de seus públicos para induzi-los ao consumo frenético de suas produções. O termo “seguidor” não tem nada de inocente: esses gurus conhecem os princípios do marketing pessoal e sabem o que fazer para criar a sua marca e fidelizar os seus clientes — ou seja, transformá-los em fieis. Um dos truques é precisamente incitar os seus seguidores a ataques furiosos contra qualquer pessoa que, ao reagir, promove involuntariamente a visibilidade do agressor. Em troca, os gurus oferecem aos seus consumidores uma ilusão de fraternidade análoga ao espírito de gangue — ainda que, naturalmente, sem os inconvenientes do confronto físico, pois tudo se desdobra no simulacro da tela do computador. Essa ilusão é forjada através da repetição contínua de um conjunto de símbolos e narrativas que os fieis reproduzem para reafirmar a própria identidade enquanto “lutam” contra aqueles que o guru define como “inimigos”.
Não é por acaso que os ataques dirigidos aos professores e às escolas, aos intelectuais e aos livros, aos jornalistas e à imprensa, assim como aos cientistas e às universidades tenham origem nesses ambientes: afinal, profissionais da educação, do conhecimento, da informação e da ciência são precisamente os antídotos a esse charlatanismo que intoxica a inteligência e as emoções de milhares de usuários. Notamos a dimensão do problema quando observamos jovens “refutando” conceitos científicos com memes de humoristas.

Fonte: Universo Racionalista


Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Aluna de Granja, Ceará, é finalista do Prêmio Peteca 2023 na categoria poesia

HISTÓRIA | Os Ferreira Veras, colonizadores das terras da Ubatuba

Missa de 6 anos do falecimento de Chico Miguel acontecerá nessa quarta-feira, 09 de agosto de 2023